Doenças psicológicas crescem entre profissionais de saúde   
Profissionais de saúde relatam experiências vividas no combate à pandemia     
Irislayne Tavares e Luana Marino
25 de Maio de 2020


Aumenta número de depressão na área da saúde por causa do coronavírus / Foto;Sebastien Bozon/AFP

José Augusto Borges de Luna, de 24 anos, trabalha como socorrista desde o ano de 2017. Este ano, porém, ele viu sua rotina de trabalho ficar intensa por conta da pandemia causada pelo novo coronavírus, que já matou mais de 23 mil pessoas no Brasil, até o fechamento desta edição. De março para cá, muitas foram as vidas que passaram pelas suas mãos, vidas que entravam em sua ambulância em busca de socorro, muitos já com dificuldades de respirar e rodeados de incertezas. A chance de ir para o hospital e não voltar, afinal, era grande.    

Foi o que aconteceu com a jovem Kamilly, de 17 anos, que morreu de coronavírus no mês de abril. Ela estava em isolamento no Hospital Moacyr do Carmo, em Duque de Caxias, Rio de Janeiro, e José Augusto lembra do tempo em que cuidou da jovem durante seus plantões. Quando recebeu a notícia de que ela não havia resistido, pensou que poderia ter feito mais. Este foi o caso que mais o comoveu desde o início da pandemia.    

Diariamente, profissionais de saúde, que estão na linha de frente no combate à Covid-19, são obrigados a lidar com histórias assim, e é praticamente impossível não se envolver, por mais que haja o distanciamento da profissão. Pesquisas mostram, inclusive, o aumento nos casos de doenças como depressão e ansiedade entre médicos, enfermeiros e socorristas. A Drª Alexandrina Marina mostra em sua tese que profissionais de saúde têm sido muito atingidos, pois eles têm facilidade de apresentar quadro de hipocondria, crise de pânico, transtorno depressivo. Ela afirma que eles são mais frágeis a essas doenças pelo uso de substâncias, aumentando o consumo de bebidas alcoólicas, tabaco ou de qualquer outra droga.  

A síndrome de Burnout é um distúrbio emocional com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico resultante de situações de trabalho desgastante, que demandam muita competitividade ou responsabilidade. De acordo com psicólogos, esta síndrome é muito comum em profissionais que atuam diariamente, como médicos e enfermeiros, por causa da pressão e das responsabilidades.  

O socorrista falou sobre o clima entre os profissionais de saúde durante o período de trabalho “A minha equipe está bastante preocupada, eles estão em um nível estressante bastante elevado, até então estão precisando de um apoio psicológico. A nossa chefia está providenciando o apoio psicológico pra nossa equipe, porque além dessa situação muito preocupante, vem os atrasos de salário e também cerca de 70% da equipe já pegou o vírus. Muitos estão preocupados não só com eles, mas com a família também.”      

Diante dessa realidade, é necessário que todas as “chefias” dos profissionais da área providenciem psicólogos para cuidar da saúde mental dos que estão na linha de frente do combate à pandemia do novo coronavírus.     

“Nossa rotina mudou completamente. Mesmo quando enfrentamos a H1N1, nunca vimos nada assim. Você está habituado a trabalhar com coisas que já conhece, os protocolos a seguir, aí veio o Covid e mudou toda a nossa rotina, nosso sistema, até porque estamos lidando com uma coisa desconhecida. Não temos um parâmetro, então até que conseguíssemos nos direcionar de maneira certa para realizar o atendimento, conversar com o paciente, e tudo mais, tinha a parte do medo, da insegurança, a parte de não saber como conduzir o tratamento, o atendimento, o recebimento do paciente. Depois que você toma algumas medidas, consegue direcionar melhor, já tem um conhecimento de como se proteger e proteger o paciente.”, contou a enfermeira Rosângela Campos, em entrevista ao jornal Voz Wesleyana.     


Foto: GettyImages

Rotina de trabalho + consequências 


José Augusto relatou como tem sido a rotina de trabalho desde a chegada do coronavírus no país. “A situação mudou muito, estamos vivendo outra realidade. O nosso trabalho dobrou e a situação complica cada vez mais, a cada plantão que a gente tira a situação piora gradativamente, isso faz com que a gente fique muito exausto durante o plantão. Uma hora ou outra, a gente pensa que poderia ser um de nós ali, ou um familiar da gente. Por mais que a gente dê o nosso máximo, torna-se bastante cansativo.” disse o socorrista.     

Uma pesquisa publicada pelo European Heart Journal, em 2010, afirma que trabalhar 3 horas a mais que a jornada de 8 horas diárias expõe a pessoa a um risco 60% maior de desenvolver problemas cardíacos. Fora a sobrecarga emocional, levando ao aumento do estresse e casos de depressão.    

Rosângela contou que já viu colegas de trabalho pedirem afastamento do trabalho e usarem sintomas físicos leves como argumento — o que expõe mais uma faceta das doenças emocionais: o preconceito que ainda existe. “Colegas pela idade, pelo medo, terminaram pedindo esse afastamento. Quando o pessoal vê que a sobrecarga está aumentando e muito, e elas não estão suportando psicologicamente, inventam afastamento de alguma forma.”     



Existe alguma maneira de lidar com a sobrecarga?     


“Eu particularmente consigo separar, desligar, mas é claro que em alguns casos você termina se envolvendo. Você cria certo elo sem querer, principalmente com paciente mais idoso. Mas a situação mexe mais com o meu psicológico quando é uma pessoa que trabalha conosco, é alguém que está ali todo dia, uma família. Eu não levo pra casa, mas em especial, alguns casos você leva pra casa, não tem jeito. Ficamos sabendo que uma amiga minha, que é enfermeira, está entubada em outro hospital, aí você pensa ‘semana passada estava aqui comigo’. A gente tenta levar com leveza, brinca, mas saber que dias depois um colega está entubado em outro lugar, não ter notícias específicas do que está acontecendo com a pessoa, mexe com você. Mas dentro de casa procuro fazer outras coisas, ver filme, brincar com meus familiares, sem tocar nesse assunto, e ultimamente, de uns 20 dias para cá, por estar em crescimento os casos, não estou muito ligada em notícias na TV”, disse a enfermeira.   

Já o socorrista José Augusto diz que nem ele, nem a equipe consegue se desligar. “Não tem nenhum momento que a gente se desliga. Por mais que a gente tente, não consegue, porque aonde a gente está e aonde a gente vai, só tem informações sobre isso.  O que eu faço para tentar amenizar é estudar, assistir TV e ler, faço isso pra tentar mudar a rotina, porque isso acaba virando uma rotina. Como os funcionários que adquiriram o coronavírus estão afastados, nós estamos com o trabalho redobrado, trabalhamos por nós e por eles. Isso acaba sendo mais estressante ainda. Quando eu estou em casa tento pensar o menos possível, porque isso acaba deixando a pessoa maluca.”     

O psicólogo Daniel Bezerra analisou diversos aspectos que fazem com que esses funcionários não consigam aliviar a carga. Daniel contou ao Voz Wesleyana que “Por causa da pressão da situação atual. Esses profissionais (da área da saúde) são essenciais diariamente no contexto atual por conta da pandemia. Acredito que o caos da atualidade se tornou uma missão de vida ou morte para eles, sabendo que todos correm perigo, inclusive os próprios familiares desses profissionais de saúde. Levando em consideração que esses profissionais possuem as habilidades que todos necessitam nesse momento. Então, o aspecto humano desperta e faz com que o desejo de cumprir seu dever seja maior que as adversidades. Por isso eles não conseguem desligar”. 

"Para eles se desligarem nesse momento de caos é muito difícil, mas podem moldar a forma de ver todo esse momento, de maneira que acreditem em um amanhã melhor com perspectivas otimistas", finalizou Daniel Bezerra. 

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